Nas últimas duas semanas, presidente da Câmara tem evitado atritos diretos com adversários ou pautas com potencial explosivo. Objetivo, segundo aliados, é fugir dos holofotes e tentar arrefecer movimentos que pedem sua saída do cargo
Após ser denunciado pela Procuradoria-Geral da República (PGR) por envolvimento no esquema de corrupção da Petrobras descoberto pela Operação Lava Jato, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), passou a adotar uma postura mais leve no comando da Casa.
Tanto adversários quanto aliados admitem que Cunha “pisou no freio” nas últimas duas semanas. O parlamentar fluminense adotou uma postura mais conciliatória nas sessões reservadas a votação. Deixou de revidar de forma mais contundente provocações de adversários. Também evitou polêmica na hora de pautar as deliberações: matérias que incomodavam o governo deram lugar a projetos de “menor potencial explosivo”, na palavra de aliados do peemedebista ouvidos pelo Congresso em Foco. Tudo para fugir dos holofotes e tentar arrefecer movimentos que reivindiquem sua saída do cargo de presidente da Casa.
No último dia 20, Cunha foi denunciado pelos crimes de lavagem de dinheiro e corrupção pela PGR. O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, não pediu o afastamento preventivo de Cunha, mas sugeriu que o peemedebista seja condenado a ressarcir os cofres públicos em US$ 80 milhões por danos causados à Petrobras e à administração pública. Segundo a denúncia, o deputado recebeu vantagens indevidas para facilitar e viabilizar a contratação do estaleiro Samsung, responsável pela construção dos navios-sondas Petrobras 10.000 e Vitoria 10.000, sem licitação, por meio de contratos firmados em 2006 e 2007.
Semblante
Desde então, o semblante de Cunha mudou. Aliados falam que ele está mais “abatido”, o que seria uma consequência direta do pedido de abertura de ação penal. Aliados e adversários afirmam que Cunha passou a adotar uma postura diferente, buscando se preservar mais e fugir de “embates desnecessários”. Um sinal disso é que o parlamentar fluminense não responde, com tanta ênfase, a provocações ou pedidos de afastamento dele da Presidência da Casa feitos em plenário por deputados adversários. “Quando um parlamentar fala sobre a denúncia, ou pede seu afastamento em plenário, ele muda de assunto. Ele não quer mais se indispor com ninguém”, analisa um aliado de Cunha.
“É lógico que ele precisa ser uma pessoa mais reservada a partir de agora, afinal de contas, está próximo de ser réu. Ele não quer, nem pode mais, atirar para todo o lado agora. Ele não é mais uma metralhadora. Agora virou alvo”, admite outro parlamentar próximo ao presidente da Câmara.
Parlamentares ouvidos pelo Congresso em Foco observam que Cunha passou a evitar conflitos visando fortalecer sua base na Casa. Base essa que ficou estremecida após as votações da reforma política e também da PEC da AGU, que vincula os salários da Advocacia-Geral da União (AGU) ao subsídio dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), teto do funcionalismo público. A PEC acabou estendendo o benefício aos procuradores municipais, o que foi alvo de reclamação de vários prefeitos que apoiaram a eleição dos parlamentares.
Dessa forma, o presidente da Câmara não somente evita conflitos como também tenta arrefecer movimentos relacionados a um eventual pedido de renúncia do cargo. Um adversário de Cunha avalia que “ele precisa de tranquilidade agora”. Principalmente pelo fato de ter ficado isolado no PMDB após a aproximação do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), com a presidente Dilma Rousseff.
Pautas
Desde a denúncia contra Cunha, a Câmara apreciou matérias mais amenas. No primeiro semestre, temas polêmicos como redução da maioridade penal, reforma política e aumentos para várias categorias do funcionalismo público foram aprovados com apoio de Cunha. No início deste segundo semestre, a despeito da ameaça da chamada “pauta-bomba”, com elevação de despesas públicas, foram aprovadas matérias de caráter mais técnico/burocrático, como mudanças no sistema simplificado de tributação (Supersimples), alterações no pacto federativo (uma que determina que a União não repasse despesas para estados e municípios) e até uma lei relacionada à reparação de dano causado pelo Estado ao cidadão.
Todas analisadas mediante acordo entre os líderes e o governo. Em nenhuma votação nas últimas duas semanas, inclusive, houve mudança entre o que foi definido na reunião de líderes e o que foi apreciado em plenário. As alterações repentinas da pauta eram alvo de constantes reclamações de parlamentares.
Aliados do presidente da Câmara entendem que, após a Lava Jato, Cunha passou a ter uma postura mais “institucionalizada”. “No primeiro semestre, ele deixou que o Eduardo Cunha, deputado federal do Rio de Janeiro, se sobrepusesse ao presidente da Câmara, Eduardo Cunha. Acho que agora, ele passou a ter uma postura, de fato, de presidente da Casa. Olhando para os rumos do país”, descreveu um correligionário.
Essa postura mais “institucionalizada”, segundo parlamentares próximos ao peemedebista, pode ser confirmada tanto pela conversa, tida como amigável, com a presidente Dilma Rousseff durante esta semana quanto pela defesa que Cunha passou a fazer, nos últimos dias, da necessidade de preservar as contas públicas.