Partido recém-criado tenta lucrar com deputados que já abandonaram a legenda; 14 agremiações tiveram um total de R$ 3,4 milhões bloqueados pelo TSE por causa do conflito
Sem nunca ter participado de uma eleição e com apenas um representante no Congresso Nacional, o recém-criado Partido da Mulher Brasileira (PMB) aguarda decisão da Justiça Eleitoral para receber mais de R$ 3 milhões do Fundo Partidário, dinheiro público que é destinado às agremiações políticas.
O montante de R$ 3,43 milhões foi bloqueado pelo Tribunal Superior Eleitoral atendendo a uma ação cautelar apresentada pelo PMB em 13 de janeiro. A quantia se refere aos valores que seriam repassados nos três primeiros meses de 2016 a 14 partidos que cederam deputados para a legenda no final do ano passado.
De acordo com as regras eleitorais, são destinados 5% dos recursos do Fundo Partidário, em partes iguais, a cada um dos 35 partidos existentes, enquanto os 95% restantes são repassados às legendas na proporção dos votos obtidos na última eleição para a Câmara dos Deputados.
Os recursos destinados pela União para o Fundo Partidário em 2016 serão de R$ 737,8 milhões. Como, até o momento, a Justiça Eleitoral não analisou a ação do PMB e o partido não existia nas eleições de 2014, a legenda vem recebendo somente R$ 87 mil por mês do Fundo Partidário – 38 vezes menos que os R$ 3,3 milhões que poderão entrar em seus cofres.Historicamente, o TSE tem entendido que aqueles deputados que se filiam a partidos recém-criados podem levar cotas do Fundo Partidário para as novas legendas. Assim foi, por exemplo, com a Rede Sustentabilidade, fundada pela ex-senadora Marina Silva em setembro de 2015. O partido recebeu, em fevereiro, R$ 1,2 milhão que estava bloqueado pela Justiça – exatamente a mesma situação vivenciada agora pelo PMB.
Acontece que, no caso do PMB, quase todos os deputados que se filiaram ao partido aproveitaram a criação da janela partidária para trocar mais uma vez de legenda – fato ocorrido com 20 dos 21 parlamentares que figuraram nos quadros peemebistas. Isso significa que, caso o TSE decida mais uma vez em favor do partido novato, o PMB estará lucrando em cima de parlamentares que não foram eleitos por ele e já nem fazem mais parte de sua bancada.
O consultor legislativo Fernando Trindade, do Senado Federal, explica que a Proposta de Emenda Constitucional que criou a janela partidária “é expressa” ao dizer que a troca de legendas durante o período não seria considerada para fins de distribuição do Fundo Partidário ou de tempo de rádio e televisão.
“Essa janela não prevê a ‘portabilidade’ dos recursos do Fundo. Essa ressalva foi feita no texto da proposta exatamente porque os parlamentares sabem que a Justiça Eleitoral tem entendido que o deputado pode levar a cota referente à sua eleição”, esclarece Trindade.
Assim, tornou-se impossível que os 21 deputados que abandonaram o PMB entre fevereiro e março deste ano levem cotas para as suas novas legendas. Resta agora à Justiça Eleitoral decidir se o dinheiro fica mesmo com a agremiação criada em outubro do ano passado ou retorna aos partidos que efetivamente elegeram esses parlamentares.
“Grave equívoco”
O Partido dos Trabalhadores é a legenda que tem o maior valor bloqueado pela Justiça Eleitoral na ação envolvendo o PMB (R$ 601 mil). De acordo com o advogado do PT, Marco Aurélio de Carvalho, o partido “seguramente irá recorrer” caso a Justiça libere os valores para o Partido da Mulher Brasileira.
“Esse é um direito de todo partido político porque a eleição de um parlamentar, por mais que seja nominal, é indissociável do partido. O PMB está incorrendo um grave equívoco querendo se beneficiar cirscunstancialmente com essa tese”, avalia o advogado.
De acordo com o consultor legislativo Fernando Trindade, é possível que algum parlamentar ex-PMB consiga uma decisão liminar na Justiça para tentar evitar que os recursos do Fundo Partidário fiquem com o Partido da Mulher – o que não ocorreu até o momento, segundo informado pelo próprio TSE.
O deputado Valtenir Pereira (MT), que foi eleito pelo PROS e passou pelo PMB até migrar para o PMDB durante a janela partidária, afirma que adotar o expediente seria “cuspir no prato em que comeu”. “Eu sabia que não levaria o fundo partidário caso trocasse de partido. Isso está claro, é chover no molhado”, diz o parlamentar.
Procurada pelo iG, a presidente nacional do PMB, Suêd Haidar, não respondeu aos pedidos de entrevista para comentar o assunto.
Valor que cada partido poderá ceder ao PMB:
Partido Valor
PT R$ 601 mil
PROS R$ 446 mil
PV R$ 410 mil
PTB R$ 346 mil
PDT R$ 338 mil
PRP R$ 307 mil
PSL R$ 194 mil
PSDC R$ 151 mil
PMN R$ 111 mil
PSC R$ 106 mil
PTdoB R$ 104 mil
PTC R$ 81 mil
PMDB R$ 80 mil
Solidariedade R$ 64 mil